Poemas do Romantismo Polonês (I)

O Wilia, de Mickiewicz, por Joaquim Serra

Em vagas cerulas, sob areias d’ouro
O Wilia altivo no correr murmura
E, como a filha da Polonia bella;
Sua face encanta por serena e pura.

Regando os plainos de encantada terra,
O Wilia Oscula o narcizo e a rosa,
Bem como o altivo adail polaco
Curvado ás plantas de mulher formosa.

O Wilia giria procurando amores,
Demanda o Niemen, por quem vive e morre,
Assim, em busca do que a traz captiva,
Linda polaca carinhosa corre!

Dezerta o Wilia seu paiz nativo,
Se atira ao Niemen, se confunde nelle.
E unidos marchão por paragens invias,
Vão cahir no occeano. que dilirio aquelle!

Captivo o Wilia, murmurando morre,
Despede ao longe verdadeiros ais,
Assim, ó virgem, n’esse amar immersa,
Só vendo o amante, de tua patria sahes!

Para clima estranho á Lithuania bella
Fugirão ambos, como o rio á virgem;
O Wilia em busca do Niemen amante,
E a virgem presa de fatal vertigem!

Ao Niemen, de Mickiewicz, por Luiz Guimarães Júnior

Oh meu rio natal! Em vão procuro
No teu regaço as vagas rescendentes,
Onde estas mãos banhei inda innocentes,
Certo da vida e do prazer seguro;

De Laura em cujo olhar li meu futuro
— Risonhos cofres de meus ais plangentes,
Guardou teu seio as graças refulgentes,
Que eu perturbava com o meu pranto puro:

Oh meu rio natal! Onde occultaste
Tantas riquezas e thesouros tantos?
Onde a minha ventura sepultaste?

Laura onde está? Aonde os seus encantos?
Tudo mirrou-se como tu seccaste!
Só vós! só vós não seccareis meus prantos!

Dia e noite, de Mickiewicz, por Luiz Guimarães Júnior

O sol no oriente rutilante brilha
No occaso a lua descambou saudosa:
A luz da aurora acaricia a rosa,
Prezado orvalho a violeta humilha.

Laura á janela surge radiante
E diz: — “Oh! lua que do céo fugistes,
Oh! violeta, porque sois tão tristes,
E tu tambem, meu pensativo amante?”

Esváe-se o dia... A lúa ergue-se linda
A violeta mais cheirosa e bella:
Laura de novo encosta-se á janela
E eu me ajoelho mais tristonho ainda!

Poema de Mickiewicz por Paulo Leminski

Choveram-me lágrimas limpas, ininterruptas,
Na minha infância campestre, celeste,
Na mocidade de alturas e loucuras,
Na minha idade adulta, idade de desdita;
Choveram-me lágrimas limpas, ininterruptas...

As estepes, de Mickiewicz, por Marcelo Paiva de Souza

No verão do mar seco aponto a proa com afã,
A carroça é um barquinho no verde e balança;
Entre as ondas do prado e as flores avança,
Fugindo do coral das ilhas de bujã.

A noite cai, nenhures caminho ou kurhã;
Estrela, guias do barco, a vista não alcança;
Longe um brilho de nuvem? Uma aurora mansa?
É o brilho do Dniestr, lume aceso do Aquermã.

Sus! – que silêncio! – ouço o curso de um voo lento
De cegonha que olho de águia não reclama;
Escuto onde a borboleta adeja, no vento,

Onde o peito nu da serpente toca a grama.
Tanta calma! – e tanto ouvido apresto atento
Que ouvira a Lituânia. – Eia, ninguém chama.

Poema de Mickiewicz, por José Santiago Naud

Por sobre a água clara e imensa
As rochas hirtas se perfilavam,
E espelha a água em sua transparência
A encosta escura que refletiu

Por sobre a água clara e imensa
As nuvens negras no alto passavam,
E espelha a água em sua transparência
Seus vultos vagos que refletiu.

Por sobre a água clara e imensa
Refunge o raio, ruge o trovão,
E espelha a água em sua transparência
A luz fugaz e o ribombo vão.

E a água, limpa na sua essência,
Imensa guarda sua transparência

Por todo lado contemplo a água,
Tudo reflito, sou-lhe fiel
No cume altivo da altiva fraga
E até nos raios – que deixo ao léu

É da falésia o eterno horror,
Da nuvem, chuvas a se transpor,
Do raio, o ruído e o seu passar,
E de mim – singrar, singrar, singrar.

Um papa eslavo, de Słowacki, por Henryk Siewierski

No meio das desavenças Deus toca
Sino monumental,
Prepara para um eslavo
O trono papal.

Este não foge dos inimigos
Como um italiano fez,
Sem medo de enfrentar as espadas,
Tem o mundo aos pés!

Seu rosto iluminado com a palavra
É a lâmpada que brilha,
Os numerosos povos o seguirão
Rumo à luz divina.

Se ele orar e der ordem
Ouve a terra toda,
Ouve também o sol,
O milagre é sua força!

Já está chegando para repartir
Forças globais novas:
Com suas palavras o sangue
Nas nossas veias se revigora;

Nos corações a luz divina
Vai jorrar e por ele
A força do espírito dará vida
Ao que o pensamento conceber.

E é preciso força para sacudir
Este mundo inerte:
Eis vem o papa eslavo
Irmão das gentes;

Ele derrama doces bálsamos
Nos nossos colos;
O coro dos anjos varre com flores
O seu trono.

Vai repartir o amor como os poderosos
Repartem agora as armas
E mostrar seu poder sacramental
Com o mundo nas mãos;

A pomba da palavra do seu hino sairá
Levando a feliz nova,
De que o espírito já resplandece
Em sua glória;

O céu se abrirá de par em par,
Em cima
Sobre quem veio ao mundo e ao trono
E os cria.

A sua voz nas nações irmãs,
Repercutindo,
Levará as almas ao fim supremo
Pelo martírio;

A força sacramental das cem nações,
Sua aliada,
Aqui diante do ataúde, nas almas
Será revelada.

Eis o espírito que verão em breve,
A sombra, depois a face,
Das chagas do mundo vai extirpar o podre,
Os vermes, o execrável,
Vai trazer a saúde, acender o amor
E salvar o mundo;
O chão das igrejas ele vai varrer,
Limpar a sacristia,
Vai mostrar Deus em criação toda,
Na luz do dia.

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