Oração do Justo Juiz, tradução medieval

Tradução do rei Dom Duarte encontrada no Leal Conselheiro.

Justo juiz Jesus Cristo
Rei dos Reis e bõo Senhor,
Que com Padre reina sempre
U é d'ambos um amor,
Praza-te de me ouvir,
pois me sento pecador.

Tu que do céu descendiste
eu no ventre virginal
u, tomando logo carne
livraste o segre do mal,
por teu sangue precioso,
de perdiçom eternal.

Logr'eu aquela, meu Deus,
ta gloriosa paixom,
que sem cessar me defenda
de perigo e cajom
per que possa bem viver,
ti servindo e outrem nom.

Tua mui santa virtude
des i gram defendimento
sempre me seja presente,
por me guardar de tormento
a que me traz o Imigo,
per arteir'enduzimento.

Per a tua forte destra
que os infernos quebraste
destrúi todos meus Imigos,
pois sas artes desprezaste,
per as quaes me sempre tórvam
do bem que fazer mandaste.

Ouve, Cristo, mim braadando,
mesquinho, por meu pecado,
que demando piedade,
pois passei o teu mandado,
ca me temo do Imigo
de mim seer apoderado.

Com destruiçom se cale
quem me cuida condanar;
seja a ele feita queeda
o laço que me quer armar;
Jesus bõo e piedoso,
nom me queiras desprezar.

Meu escudo com emparo
sei tu, meu defendedor,
porque eu, per tua graça,
vença o meu perseguidor
e, per seu derribamento,
m'alegre com teu amor.

Manda o teu messegeiro
do céu alto, Sprito Santo,
qu'esclareça e alumee
mim que nom mereço tanto,
e dos imigos me livre,
por non receber quebranto.

Santa Cruz, o teu sinal
me defenda os sentidos;
ta bandeira vencedor
faça seer sempre abatidos
meus imigos e contrairos
per ta graça destruídos.

Amercea-te de mim,
Cristo Deus um só nacido,
pero eu mais bem te peço
que non tenho merecido;
sei de mim sempre lembrado,
por em fim nom seer perdido.

Ó Deus Padre e Deus Filho,
também Deus Sant'Esprito
que um Deus sempre és chamado,
per palavra e per escrito,
cumprimento de virtudes,
te confesso per meu dicto.

 

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